segunda-feira, abril 30, 2007


onde estão as pedrinhas que te dei nessa tarde de verão? arrumadas numa gaveta com a tua habitual minúcia? lançadas ao mar para que perenes nos prolongassem? ou num assomo de raiva atiradas para a borda de um qualquer caminho?

pedrinhas com que lavrámos a sangue esse abrasivo amor que o calor não derretia. derreteu-o o tempo - lapidar esfuminho das nossas vidas.

onde estarão as pedrinhas? ainda terão a coloração do sangue? - só o desfoque da minha memória nessa tarde de estio quando o mar roncava forte sobre equinócio das nossas mãos indivisíveis.

onde estarão as pedrinhas? na minha memória consentida.


HFM - Lisboa, 14 de Abril de 2007



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sexta-feira, abril 27, 2007

Uma viagem no tempo




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CONVERSANDO A SÓS COMIGO


*


perco-me em mim e no nada
sou um labirinto de memórias
onde o fio se perdeu
suspeito até que Ariadne não exista
nem eu
nem o tempo
e o local seja apenas o espaço
onde me confesso.


HFM - Lisboa, 26 de Abril de 2007



* fotografia do labirinto do chão da Catedral de Chartres

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quinta-feira, abril 26, 2007

A amizade não se agradece


acolhe-se, respeita-se e guarda-se mas há que dar notícia deste post pois os excertos de Camus são imprescindíveis para quem esteve nesse local e para todos que sabem como, através da palavra, Camus se revelava.

Quem conseguir encontrar tempo e disponibilidade interior para sentir a magia de certos locais receberá em troca a interioridade e a paz que tantas vezes, em vão, se persegue.

Ao Eduardo o meu obrigada.


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quarta-feira, abril 25, 2007

Em slow-motion


assim o sinto; tanto que ficou por cumprir! Por culpa dos políticos? seguramente; mas também por este raio de país e de feitio dos seus habitantes que não têm coragem ou predisposição para usufruir do seu direito e dever de assumir a força da opinião pública.

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terça-feira, abril 24, 2007

Fiesole




Não vos sei dizer da depuração franciscana que me invade. Bem cedo na manhã quando vinha à espera da vista sobre Florença que ficou aquém, deparei-me com o pequeno convento de S. Francisco antecedido por um cruzeiro e uma espécie de ágora com uma loggia, completamente despojada onde o peregrino encontrava abrigo.

A igreja, sóbria, tem poucas mas belas pinturas e um vitral encimando a porta que os meus olhos captaram na pureza da sua cor e forma.

O melhor estava guardado para os olhos que, antecedidos de estudo prévio, iam à procura do chiostrino (claustrinho) – não o procuro descrever, só a fé ou a arte podem produzir aquela minúscula depuração onde se ouve o silêncio. Onde, se dúvidas tivéssemos, sabemos que a interioridade é possível.

Há outro claustro maior, muito menos interessante, ao lado do qual há uma pequena escada que conduz às células dos monges – 4m2 no máximo!

Cá dentro há o silêncio dos hinos de paz.


*** * *** * ***


Aqui poderá encontrar alguns traços e cores.


Fiesole, 17 de Março de 2007










Nossa Senhora de Margot Einstein filha do próprio! e que fica num pequeno nicho no claustrinho



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domingo, abril 22, 2007

Apanhada - Thinking Blogger Award



A Wind "apanhou-me" em mais esta corrente "blogueira" o que lhe agradeço. Hesitei muito antes de me decidir a participar por diferentes razões das quais ressalto duas:

- O já estar muito farta destas correntes de "modas" que têm assaltado a blogosfera;

- a mais importante de todas, porque vou deixar de fora blogues que muito me dizem e que habitualmente visito e que têm uma qualidade igual aos cinco que escolhi, o que nada me agrada. Ainda por cima há pelo menos um que não vou escolher pois também já se viu nas mesmas circunstâncias que eu.

Pedindo desculpa aos respectivos autores

Absorto

Bons Tempos Hein

Local e Blogal

Nu Singular

Tubo de Ensaio


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Dando asas ao poema


que asfixiava na caixa de comentários do meu post de ontem. Obrigada Eduardo.

Onde está


Onde está a seara de vento que ondulava
Azul no meu pensamento
Com sons de trigo a escorrer pela eira
E o dia a morrer devagar
À minha beira à vista dos olhares belos
Por vezes tristes de melancolia

Onde se esconderam os gestos antigos
Rasgados e sem medida
Abraçados ao corpo que se despedia
Olhos ao alto num rosto
Cheio de lágrimas
Salgadas do gosto da carne ferida

Onde está a minha vontade desmedida
Que não a encontrei mais
Flamejante a incendiar os sonhos
Impressos a sangue quente
Na ausência habitada
Da tua crença em mim perdida


Eduardo Graça - 20/4/2007



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sábado, abril 21, 2007

Citando # 168





Não somos proprietários do mundo, são os nossos filhos que no-lo emprestam.

Antoine de Saint-Exupéry



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sexta-feira, abril 20, 2007

Do diário de Florença


Um recanto do apartamento de Florença.



Sentires que não tens casa. Ou muitas. Os tectos onde dormiste e onde te deixaste. Do simples quarto à casa que tornaste tua. Onde te deste. Que aconchegaste.

Aquele quarto longínquo no anexo da pensão onde, adolescente, não dormias para usufruíres da benesse de teres um quarto só teu. Esse outro quarto em St. John’s Wood onde o parapeito exterior da janela de guilhotina te servia de frigorífico. O TCP e a nossa primeira casa onde a minúscula kitchnette nos parecia um amplo salão.

O domus que sempre construíste em ti personalizando cada tecto onde viveste.

A casa, teu huit-clos imprescindível.

A casa onde agasalhas as dúvidas, onde armazenas os sentimentos, onde sedimentas as vivências.

A casa, o invólucro do teu nada onde te preenches.

A casa, dimensão insondável do devir.


HFM - Florença, 19 de Março de 2007



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quinta-feira, abril 19, 2007

NA COR ALARANJADA DO SONO


belisca-me a noite por ceder
são os enredos desenraizados
é o bater da chuva no pátio ao lado
é o sono espreitando apressado
e o rasgar do sabor de saber-te

aquele instante em que te olhando
me sei.


Florença, 19 de Março de 2007



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segunda-feira, abril 16, 2007

VIAGEM NA HISTÓRIA



Era um profundo conhecedor de filosofia especializado em Sócrates; fora professor mas, por via das suas ideias, tinha sido impedido de ensinar, sobrevivera dando explicações a alunos da faculdade a quem, não raras vezes, escrevia as teses.

Era ainda conhecido pelos seus preciosos conhecimentos dos locais a visitar sobre cultura grega, etrusca, romana e, particularmente, sobre Sócrates; por exemplo, aquele mosaico no chão do Duomo de Siena dedicado à cultura grega onde se destacava o nome do filósofo. Discorria ainda sobre pintura e os principais locais onde ela podia ser observada e ainda sobre os itinerários imprescindíveis a quem quisesse percorrer os passos dos grandes Mestres, alguns dos quais só conhecidos por meia dúzia de iniciados.

Era frequente perguntarem-lhe:

- Quantas viagens já fez?

Invariavelmente respondia:

- Nenhuma! Nunca me concederam o passaporte!



HFM - Florença, 14 de Março de 2007



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S. Gimignano





Aqui as pedras não têm silêncio. Dos buracos solta-se o eco. As vozes. O tempo assobia presságios. E histórias. Amplos horizontes distribuem-se do alto das torres. Há um eco particular para cada viajante. O meu encontrou-se comigo na Porta de S. Matteo, sentou-se no café na praça da cisterna do séc. XIII e vai conduzindo os meus passos até às fontes medievais que se encontram bem lá no fundo, onde do chão jorra água.

São passos dispersos na certeza de todos os ecos incrustados e da veracidade de cada história inventada.

Como numa prece reconto-me nos sedimentos do tempo.


Aqui encontrará alguns rabiscos de S. Gimignano


HFM - S. Gimignano, 15 de Março 2007
















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sábado, abril 14, 2007

TERIA DE SER DITO


não te direi dos portais
- não caberias entre paredes –
guardei-te lugar no pequeno jardim
onde o céu era promessa de além
o lago a casa onde moraríamos
e o ocre da terra os retalhos
que à fome serviríamos

entretanto
- quando o silêncio planasse -
na geografia das árvores
desenharíamos
com a sanguínea da vida
o rio sem foz
onde nos unimos.


HFM - Lisboa, 12 de Abril de 2007



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sexta-feira, abril 13, 2007

OLHARES FLORENTINOS


A entrada do prédio onde tinha o apartamento



Virei no ângulo da velha igreja que sempre encontrei fechada. Quando, dobrada a esquina, me encontrei na outra rua a montra sobressaiu. Nem sabia do que seria, sempre encontrara corridas as grossas protecções acinzentadas. Hoje havia cor e o movimento que esta sempre empresta aos quadros. Deparei-me com uma espécie de antiquário de gravuras e telas. Um bric-à-brac. Parecia até que uma rabanada de vento tinha não só levantado as pesadas persianas como tinha despenteado os quadros ali dispostos. Por detrás deles – o quadro – uns olhos verdes translúcidos e uma farta cabeleira branca. Um quadro ao vivo mimetizando a ambiência que, da rua, se captava.

HFM - Florença, 19 de Março de 2007



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quinta-feira, abril 12, 2007

APONTAMENTO







Um belo quadro – a neve pintando o verde da montanha Pistoiana.

HFM - Pistoia, 22 de Março de 2007








Estátua duma das muitas praças de Pistoia


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quarta-feira, abril 11, 2007

ENCONTROS II

[Fra Angelico]


A chuva corria miudinha e leve e a brisa afagava o rosto como uma mão gélida. Um pouco cabisbaixa percorria apressada a Piazza della Signoria. Vinha dos Uffizi e dirigia-me ao Duomo; perto da loggia ouvi murmurar:

- Buona sera, Signora.

Voltei-me e, de relance, reconheci, mais pelas vestes do que pelo traço do rosto, Fra Angelico. Também ele caminhava apressado.

A meio da praça, parados à chuva e analisando um papel espesso e de lados incertos, apercebi-me das silhuetas de Duccio, Cimabue e Simone Martini. Quando passei, olhando-os, baixaram-me a cabeça.


[Cimabue]


Dois vultos cruzaram-me e um perguntou-me:

- Lei ha visto le nostre pitture?

Olhei-os e sorrindo respondi:

- Ma como no?

E nada mais acrescentei porque o meu italiano e a minha timidez não conseguiram obrigar-me a dizer-lhes o quanto os amava. Eram tão só Botticelli e Ghirlandaio.

Um pouco à frente desenhando no ar com uma mão e falando sozinho sem nada ver cruzou-se comigo Leonardo. Voltei-me e segui-o, como se segue o Mestre. Ia apressado também na direcção do Duomo. Um pouco à frente, na Via dei Servi, vi-o entrar numa casa, julgando ser a sua ia a afastar-me quando o jovem Masaccio apareceu a uma janela.


[Masaccio]


Quando retrocedia ouvi uma voz dizer:

- Sono andato a congedarmi di Michelangelo però la prossima settimana gli há fissato appuntamento vicino al Tondo doni.

[Michelangelo]


- Grazie, Signore.

- Rafaello, piacere – disse ele enquanto baixava a cabeça e se afastava.

Continuei o meu caminho enquanto, inquieta, esperava ver surgir de cada portal florentino todas as outras sombras.




HFM - Florença, 8 de Março de 2007

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terça-feira, abril 10, 2007

Em memória

Ontem, quando cheguei, tive a notícia triste da morte de Eliane Stoducto uma amiga brasileira que, nunca tendo conhecido em pessoa, me acompanhou durante longos anos nesta teia da Net, das suas palavras e das suas empatias. Fui apanhada de surpresa e há em mim aquela névoa que impede que as palavras revelem o que sinto.

Ainda em 16 de Janeiro no seu blog em desalinho ela publicara o meu poema Sísifo.

Deixo aqui o poema que se encontra no template do seu blog. Poderia colocar muitos outros dos seus poemas mas creio que não foi por acaso que ela escolheu este. Ela sabia da sua doença, eu não.



Palhaça


O tempo passa

e eu,

palhaça,

no circo maldito

choro risos




Eliane Stoducto


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segunda-feira, abril 09, 2007

Da persistência


Dilui-se no tempo a espera
nos medos destacam-se as sombras
na garganta o assobio
e a voz que retenho
quando embrulho no mar o Arno


- medievos painéis de memórias!


HFM - Ericeira, 4 de Abril de 2007



Nota: De regresso e espero agora retomar os blogues na sua normalidade.

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terça-feira, abril 03, 2007

Cézanne em Florença, em Siena e outros mestres






Cézanne




















Guttuso















Alberto Burri










Um dos privilégios que tive nesta viagem foi de me deparar com duas exposições fora de série. Uma em Florença, cujos cartazes cobriam, em grande faixas, as ruas da cidade - Cézanne a Firenze; era na realidade o conjunto de obras primas de duas colecções de Egisto Paolo Fabrbri (Nova Iorque 1866-Florença 1933) e de Charkes Loeser (Nova Iorque 1864 - Florença 1928).

As colecções eram essencialmente com obras de Cézanne - entre elas destaco Madame Cézanne na Cadeira Vermelha, Casa no Marne - As banhistas. Havia ainda quadros de Van Gogh, Pisarro, Rodin, Matisse e Fattori. Realmente um privilégio que vi no segundo dia de abertura da exposição.

A outra foi em Siena, exposição que tinha visto anunciada no comboio Milão/Florença. Nos anexos do convento que fica em frente ao Duomo e que estão arranjados para exposições com uma arquitectura arrojada para o local mas de muito bom gosto encontrei, entre muitos outros, Cézanne, Monet, Renoir (obras do início da sua actividade com paisagens onde, para além da cor, nada diria tratar-se de Renoir), Carrá, De Chirico, Severini, Morandi, Guttuso (de cuja obra sou admiradora), Montale, Braque, Burri, de Stäel e de vários italianos que não conhecia dos quais destaco: Donghi, Mafai, Capogrossi, Mattiacci, Marini.

São estes acasos que tornam as viagens o espanto que nos lava a alma e os olhos.


Certamente só para a semana voltarei aqui e então na regularidade habitual. Até lá, boa Páscoa a todos.


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segunda-feira, abril 02, 2007

Por ordem aleatória





ENCONTROS IV

Para além do olhar
um povo
para além da força
a juventude
para além da beleza
a fé
gémeo de si próprio
David recriou Miguel Angelo.


HFM - Florença, 10 de Março de 2007



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domingo, abril 01, 2007

Da chegada


Depois dum atraso de mais de 4h cheguei esta madrugada (obviamente que foi na TAP). O cansaço é grande e vim apenas deixar umas palavras. Logo que possa irei fazer a ronda dos meus amigos blogueiros. Deixo o que escrevi ontem.

DESENCONTROS *

todos se foram
quando sobre o Arno a poalha
ecoou a nossa partida.


* o nome tem a ver com uma série de poemas e prosa que escrevi com o título Encontros e fui-os numerando, creio ter colocado aqui dois. Este será o final.


HFM - Florença, 31 de Março 07



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