NÃO ME LEIAS
Na Rua Anchieta, comprara o livro por duas razões: o título – NÃO ME LEIAS e a cuidada assinatura nas duas primeiras páginas – ANA CATARINA LACERDA, a mesma da autora do livro.
Nunca tinha ouvido falar de ANA CATARINA LACERDA mas o título era, para mim, uma trouvaille e chegava para justificar os 1,5 euros que por ele me tinham pedido. Os poemas não eram a minha área mas aquela caligrafia cuidada, inclinada sobre a direita mas nada tendo da antiga letra inglesa, suscitara-me a curiosidade e, ao arrepio de mim próprio, sentira necessidade de conhecer aquela enigmática ANA CATARINA LACERDA. A tal que apunha o seu nome, como tantos de nós fazemos nos livros que compramos; mas aquele não era um livro qualquer, era o seu próprio livro de poemas em edição de autor.
Interessou-me logo esta mulher que autora se queria leitora, que leitora não se identificava com a autora.
Que rios de palavras afastariam estas duas metades? Qual a mulher? Qual a poetisa? Qual a leitora?
Via-a nas noites quentes sentada, devorando o ritmo na palavra, encantando-se na melodia das técnicas, percorrendo a noite na companhia que autora e leitora se faziam mutuamente.
Pressentia ainda que aquela ANA CATARIANA LACERDA, a da letra miúda ligeiramente inclinada e perfeita, deveria ser a maior crítica que alguma vez tivera a outra ANA CATARINA LACERDA.
Li o livro de enfiada e, não sendo leitor assíduo de poesia houve, contudo, uma coisa que seguramente podia afirmar – NÃO ME LEIAS fora o nome que a leitora emprestara à autora quando esta, num dia de loucura, lhe tinha passado para as mãos as páginas manuscritas do futuro livro e ingenuamente pedira uma opinião.
HFM - Lisboa, 23 de Novembro de 2007
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