sábado, novembro 01, 2008

Do diário


Há momentos em que dentro de mim não sou eu. Outra. Alguém que me fita sem me conhecer. Uma vindoura que não conviveu comigo. Que não foi. Oiço-a e as palavras não são minhas, muito menos os tiques. Quem colocou dentro de mim esta? Porquê assim? No vazio dos dias que se seguem a uma insónia é sempre outra que me atormenta como se a porta tivesse ficado aberta e eu tivesse partido para ir dormir.

Podes-te calar, ao menos? Deixa que os solavancos da vida me adormeçam sem que este eco pertinente ferre os dentes nas minhas dúvidas. Deixa que o dia suceda ao dia sem me instalares a dúvida das horas que restam. Deixa que, por entre a chuva, eu sinta o sol. Deixa que a simplicidade dos néscios invada os gritos da ansiedade. Deixa. Deixa, ao menos, que eu e tu convivamos como se fôssemos uma. Deixa que o sal traga o sabor dos dias de sol e de preguiça. Deixa, deixa que eu te esfole para que de ti só reste a pele acobertando os meus minutos. Deixa, já que eu não consigo deixar que tu existas.


HFM - Lisboa, 31 de Outubro de 2008



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