sábado, abril 16, 2005

sob as Hespérides - Gonçalo B. de Sousa


era bom que o mundo fosse diferente,
mas eu sou só um e mais não posso.
pelos pomares do mundo há árvores
enegrecidas, com maçãs de chumbo.
um sou, mais não poderei? e como não?
pus um vaso na varanda, ao sol dos dias;
mão rudes o modelaram; certeiros dedos
de mulher lhe pintaram quimeras de fogo,
uns frutos, estrelas e corações escarlates.
se mais não puder, como me explicarei
diante das crianças de ouro, que riem
abundantemente, como arroios à solta?
da terra que apanhei do chão, nasceu
uma planta de um verde estranho às casas
de betão; alimenta-se do vento e da água e,
suspeito-o, do fogo que lhe é interior
(de onde vem a luz, que não se lhe vê a fonte?)
essa é a minha planta verde, posta
num vaso de quimeras: a minha bandeira
no solo de betão lunar, ao abismo da rua,
vertical como as árvores errantes
na planície, com frutos como corações,
sob as incorruptíveis Hespérides guardiãs.
sou um só - no entanto, bastam duas mãos
para agarrar a lua que orvalha as madrugadas.



gonçalo b. de sousa

7/9 - 3 - 2005



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