quarta-feira, abril 20, 2005

Quando conheci Michel Foucault, em 1966, em Paris, no 15ème arrondissement


Vinha na rua com um amigo, professor em Nanterre, quando, de repente, ele me dá uma ligeira cotovelada e baixinho murmura:

- Aquele que aí vem é o Michel Foucault!

- Conhece-lo?

- Sim.

- Apresenta-mo.

Pierre olhou para mim incrédulo quando Michel Foucault se aproximava.

- Bonjour, Pierre.

- Olá, Michel, estás bom ?

- Muito atarefado com o meu retorno de Clairmont-Ferrand e a partida para Túnis.
E o teu trabalho?

- Vai andando, como é possível no caos de Nanterre! Já agora apresento-te H., uma amiga minha portuguesa.

- Prazer – disse Foucault olhando-me – também é professora em Nanterre?

- Não, estou apenas em Paris a passar uns dias. Foi um prazer conhecê-lo.

- Conhecer-me? A gente nunca se conhece.

- Bom, se quiser, falar-lhe. Já viu o que no meu país isso pode contribuir para o meu currículo?

Quando acabei a frase já tinha uma cotovelada de Pierre e Michel Foucault dizia.

- Você é rija, de resposta pronta!

- Descarada, se quiser! Talvez seja a única maneira de convivermos, nós os comuns mortais, com as figuras públicas!

- Figura pública? Ainda falta muito para o vir a ser. Mas esteja confiante, pois sê-lo-ei. Já agora quer um autógrafo? pode vir a dar-lhe dinheiro!

- Não, preferia que me enviasse um livro seu autografado, pode ser aquele sobre a loucura. É que loucos somos todos nós!

- É engraçada a tua amiga! digamos um pouco desbocada! Pode estar certa que através do Pierre o livro há-de chegar-lhe às mãos!

- Enchantée! Um dia ficarei rica por conta dele!

- Isso é que você não sabe!

- Se me garantiu que um dia há-de ser um figura pública e como eu sou mais nova... aí tem!

- Elle a une verve! Como se chama ?

- Phantôme!

- Phantôme? mais vou plaisantez!

Larguei-me a rir. Como eu gozava comigo própria quando inventava estes diálogos impossíveis!


Lisboa, 12 de Abril de 2005

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